quinta-feira, 2 de agosto de 2007

CARA DE LEÃO, CORAÇÃO DE CORDEIRO.


Apocalipse 5: 5-8

5 E disse-me um dos anciãos: Não chores; eis aqui o Leão da tribo de Judá, a raiz de Davi, que venceu, para abrir o livro e desatar os seus sete selos.

6 E olhei, e eis que estava no meio do trono e dos quatro animais viventes e entre os anciãos um Cordeiro, como havendo sido morto, e tinha sete chifres e sete olhos, que são os sete espíritos de Deus enviados a toda a terra.

7 E veio, e tomou o livro da destra do que estava assentado no trono.

8 E, havendo tomado o livro, os quatro animais e os vinte e quatro anciãos prostraram-se diante do Cordeiro, tendo todos eles harpas e salvas de ouro cheias de incenso, que são as orações dos santos.

Outro dia, enquanto estava a observar uma gravura, tive uma revelação de algo grandioso acerca deste texto bíblico.
Era uma bela gravura de aproximadamente quatro metros de comprimento por dois de altura que alguém mandara fazer para colocar na parede atrás do púlpito em uma igreja. Nela havia uma floresta monocromática e dois animais coloridos. Um deles era um enorme leão, o outro um pequeno cordeiro. O grande felino estava em destaque, deitado majestosamente sobre a grama e a sua frente estava o inocente e inofensivo cordeirinho de cor branca. Era uma mensagem fotográfica que, através de processos de trucagem, denotava um opulento leão a proteger um débil cordeirinho.
Acima da gravura, havia uma frase que dizia: “Jesus: minha segurança”. Qualquer pessoa, com um pouco de conhecimento bíblico, ao olhar para gravura e ler a frase em destaque, diria de boca cheia - O leão da gravura representa Jesus e o cordeiro sou eu . Esta era, exatamente, a mensagem que o autor da gravura queria passar para igreja através daquele grande painel fotográfico. Entretanto, analizando melhor a gravura pude perceber uma outra mensagem completamente diferente da maioria. O texto bíblico em questão, me veio à cabeça e fui assim que pude conferi-lo. Reparei que nos versículos 5 e 6, um dos anciãos apocalípticos convida João a conhecer o Leão da Tribo de Judá. Paradoxalmente, João ao olhar entre o trono e os seres viventes não se depara com um leão mas, sim, com um cordeiro. Diante dessa constatação fiquei a me perguntar : Porque o ancião apresentaria um cordeiro como leão? Ou porque o ancião diz : Eis o Leão... entretanto, o que João vê é um cordeiro?
Diante desse questionamento, pude constatar que, o “Leão da tribo de Judá” nunca foi um leão, no sentido literal da palavra. A expressão do ancião, só é utilizada para demonstrar a presença daquele que vencera para abrir o livro e desatar seus selos. O termo “Leão da Tribo de Judá” é um título e se refere a Jesus Cristo o “Cordeiro de Deus” o “Agnus Dei” que tira o pecado do mundo. Este sim é o grande vencedor! O poderoso porém humilde, o forte porém submisso, o Senhor porém servo , o rei porém súdito, o vencedor porém resignado, o Leão porém Cordeiro. Mas, eu precisava de bases bíblicas para dar respaldo aos meus argumentos. Então, para minha surpresa, descobri que a expressão “Leão da Tribo de Judá” aparece no mesmo livro apenas uma vez, ao passo que o nome "Cordeiro", aparece trinta vezes no mesmo livro do apocalipse.
O que mais me espanta é o fato de que quase ninguém dá a mínima para o “pobrezinho” do cordeiro, só se fala em leão. É leão para cá, leão para lá, leão em letras de hinos, courinhos, slogans de igrejas, camisetas, adesivos de carros, frases de impacto, fotografias em púlpitos ou símbolos em fachadas de igrejas, coreografias e até já tem uma tal de "unção do leão". Mas se é pra “animalizar” a coisa então o cordeiro oferece muito mais base bíblica, não é verdade? Tem cordeiro simbolizando Jesus Cristo em quase toda a bíblia. O próprio João Batista apresenta Jesus como o “Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo”.
O fato é que algumas denominações brasileiras, não querem se identificar com um animalzinho tão frágil, submisso, resignado, humilde, calado, obediente, amoroso. Preferem símbolos que denotem poder, autoridade, força, coragem, valentia, intrepidez, conquista. E o leão é tudo isso e mais alguma coisa. Em outro episódio, encontramos novamente citações envolvendo este animal poderoso. Em I Crônicas 12:8, a narrativa bíblica faz menção de homens da tribo de Gade que tinham rostos como de leões. Estes se juntaram ao exército de Davi em Ziclague, para lutarem contra Saul. Esta história tem inspirado discursos arrebatadores e até nomes de denominações. Todavia, uma coisa me preocupa. O fato de que estes personagens, além de inspirarem valentia, confiança, coragem, lealdade, estão também associados a um sentimento belicoso no sentido literal da palavra. Os valentes de Davi, embora fossem homens considerados, na época, imbuídos de uma missão divina ao lado do rei, eram personagens violentos e treinados para matar. E por isso, penso eu, não são referência para a igreja de Cristo. Afinal a base do cristianismo é o amor.
Tenho observado alguns crentes que são incapazes de perdoar, de amar, de se humilhar ou mesmo de reconhecerem quando precisam sair no prejuízo algumas vezes. Penso que estes sentimentos egoistas são efeitos colaterais que surgem a reboque de discursos triunfalistas baseados em textos como este em questão. Diante disso me pergunto: Até onde a igreja de Cristo estaria buscando inspiração em figuras, elementos ou personagens que estão tão carregados de símbolos de poder?

"Não farás para ti imagem de escultura, nem alguma semelhança do que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra" (êxodo 20:4).
Além da questão que está relacionada com a tendência de identificação com figuras de poder, há uma outra questão que merece igual, ou maior atenção, para a qual desejo chamar a atenção. A introdução de figuras ou imagens de animais nos templos.
O judaísmo, primeira religião monoteísta, deu origem ao cristianismo e ao islamismo todas estas três grandes religiões, embora sejam diferentes em suas características, não praticam cultos a figuras de animais ou mesmo aos chamados "animais sagrados". A zoolatria tem sua origem em religiões pagãs, nelas os animais aparecem como guardiões de templos. No Egito,por exemplo, a zoolatria era muito levada a sério. Um egípcio era capaz de deixar toda sua casa ser queimada por um incêndio pelo dever de socorrer seu gato.Várias múmias de gatos foram encontradas nos sepúlcros egípcios.
Mesmo em nossos dias tal prática ainda está presente em países como a Índia, por exemplo.
Fico me perguntando se isso não seria um indício de volta ao paganismo. Estariam estas igrejas criando para si algo que substitua o bezerro de ouro? Só falta agora criarem Leões de ouro, e isso, diante de tanta heresia que se vê por aí, não está longe de acontecer.
E fato que o reino animal possui espécimes admiráveis. Alguns se destacam pela beleza, outros pela força, pelo poder. O homem desde sempre demonstrou grande admiração pelo mundo animal. A própria bíblia é repleta de citações de animais e algumas delas são clássicas no meio evangélico, como por exemplo, a serpente que enganou Eva, a mula que falou com Balaão, os corvos que alimentam Elias, pelicanos, corsas, peixes e até formigas. Povos bem anteriores ao nosso já tinham animais como objetos de adoração. A civilização egípcia, por exemplo, praticava o culto a deuses cuja figura podia ser a de um falcão como o deus Hórus. Também adoravam deuses com figuras de gatos, serpentes, vacas, chacais, carneiros, babuínos e outros animais que através de características específicas representavam algum tipo de divindade. [1]
Até hoje um dos canais de TV por assinatura de maior audiência é o National Geographic. Os programas mais assistidos neste canal são os documentários sobre vida animal e os leões, curiosamente, já foram temas de inúmeros destes documentários[2].

Uma das características que marcou a igreja protestante em seus primórdios foi a luta pela extinção de todas as imagens de santos dos templos. A idolatria para Deus é algo abominável o ídolo nada é no mundo 1 Coríntios 8:4 . Os pais da reforma protestante lutaram muito para banir as imagens das igrejas e agora, algumas igrejas estão introduzindo imagens de animais em templos.
Um dia desses passei em frente a uma igreja evangélica onde observei na entrada do pátio externo, a estátua de uma águia em tamanho natural, com suas asas abertas e olhando pra todos que entram pelo portão da igreja.
Há, aproximadamente, vinte anos, assisti a um estudo bíblico cujo o tema era: "renovados como as águias". O estudo era baseado em Isaias 40:31 e foi ministrado por um pastor renomado da época. Confesso que gostei muito dos argumentos do pastor que, brilhantemente, falava sobre a natureza e os atributos das águias. Como elas voam, como se alimentam, como enxergam, como criam seus filhotes, como enfrentam as tempestades etc. O pastor sabia, como ninguém, fazer associações destas características com a necessidade de um renovo constante para a vida espiritual dos crentes. Até ai, tudo ótimo, na época, não existiam imagens de animais em templos, e o máximo que se podia extrair do estudo em questão eram ensinamentos espirituais com bases bíblicas. Mas daí a confeccionar ou comprar uma imagem de um animal e colocá-la na frente ou dentro de uma igreja é algo, no mínimo, estranho.
O leão, a águia, a corsa são, de fato, signos (semiótica) de poder. Imaginar que somos vencedores, poderosos, valentes, ágeis é algo muito positivo sob o ponto de vista da auto-estima. Todavia, vencer como um leão não é difícil. O difícil é vencer como um cordeiro, mesmo sendo um leão. Esta é a grande lição que Jesus quer nos ensinar em todo o livro do Apocalipse. Ser mais que vencedor é lutar como um leão mas vencer como um cordeiro.

Para concluir, posso dizer, com toda a sinceridade, que não tenho, absolutamente, nada contra alguém que queira ter "cara de leão" ou pés de corsa, azas de águia, chifre de carneiro ou qualquer outra qualidade do reino animal, contanto que, este crente, tenha sempre, sempre e sempre um coração de Cordeiro.



Pedro Franco

[1] http://www.klepsidra.net/novaklepsidra.html
[2] http://google.nationalgeographic.com/search?site=default_collection&client=default_frontend&proxystylesheet=default_frontend&output=xml_no_dtd&oe=UTF-8&q=lions&btnG=Go

Um comentário:

Anônimo disse...

Sua postagem é muito atual. Cada vez mais, vejo figuras de leao nos out-doors proximos ao púlpito. Hoje fui surpreendida com uma estatueta de leão sobre a mesa da ceia. Fiquei chocada.